Há livros que marcam uma época e são catalogados como "bestsellers", outros ultrapassam períodos de tempo e duram centenas de anos e são considerados "jóias da literatura", mas há aqueles que se mantêm eternamente ao longo da história e se tornam textos essenciais e de consulta diária, na medida em que marcam a tarefa social e adquirem a qualidade de "excepcionais", são muito poucos e dentro deles encontramos, naturalmente, a Bíblia, e esta da qual escrevemos hoje: Lun Yu ou mais conhecida no Ocidente como Os Analectos. Esta semelhança de aceitação social no caso da Bíblia: ambos os testamentos, o novo e o antigo, para alguns podem ter a sua explicação na essência religiosa do seu conteúdo, também, livros semelhantes em termos de referência a outras religiões, demonstraram manter a sua validade ao longo do tempo. Em todos eles há conteúdos dogmáticos, histórias com ensinamentos e, sobretudo, um profundo sentido humano e ético, o que implica que aqueles que folheiam as suas páginas se sintam fortalecidos nas suas virtudes e na essência moral da sua conduta. Excepto em algumas partes, todos estes textos, especialmente no Novo Testamento, o humanismo transborda cada uma das suas páginas e sente-se como se fosse sua a dor de Jesus no Calvário. Mas no final é um texto religioso, o que não é o caso do Analectos, onde independentemente de alguns aspectos relacionados com cerimónias rituais, luto e adoração dos antepassados, a essência do livro gira em torno de uma doutrina de natureza ideológica, relacionada com uma das figuras humanas mais complexas e carismáticas da história, o sábio, professor e filósofo chinês Kung-Fu-Tsu, tornado conhecido no mundo ocidental como Confúcio. Desta forma, manifesta-se uma primeira e importante diferença entre os textos que acabamos de mencionar como protótipos de livros que não perdem a sua validade com o passar do tempo, porque, embora numa primeira tentativa, Confúcio foi apresentado na Europa vestido de carácter religioso - o que também aconteceu, em certa medida, na China ao longo da história -, A verdade é que o confucionismo como doutrina não é uma religião, nem um sistema filosófico acabado, mas uma simbiose eclética, que gira principalmente em torno da ética, da moral, da educação e da política, onde o papel principal é assumido pelos dois primeiros, o que torna o seu conteúdo essencialmente humano e dele emanam valores e virtudes valiosos, tais como bondade, igualdade, benevolência, respeito pelos cidadãos e pelos seus direitos inalienáveis, e a família como centro da sociedade. Talvez o humanismo expresso em cada uma das páginas, que quando foram escritas não eram feitas de papel mas de rolos de ripas de bambu, ou as palavras recolhidas na tradição oral do povo Chinês, quem quer que corresponda ao valor dos Analectos. As doutrinas de Confúcio não pertencem apenas ao povo chinês, ou aos países asiáticos vizinhos, são como o legado cultural dos filósofos gregos e das grandes figuras do Renascimento, bem como dos movimentos sociais progressistas que trouxeram a sociedade ocidental para onde hoje nos encontramos, porque é necessário apagar de uma vez por todas a fronteira que separa o Oriente do Ocidente, que pode ser geográfica, mas não humana, uma vez que a cultura é única, universal, independentemente da origem das suas principais figuras, seja ela do Oriente ou do Ocidente. Quando Confúcio e seus discípulos falam nos Analectos, eles falam por todos os seres humanos, e seus ensinamentos são propriedade da humanidade como um todo, assim como a mensagem humanista que emana da Bíblia, de obras como Dom Quixote e outras jóias literárias da humanidade, são de todo o mundo, independentemente da nacionalidade, local de nascimento, raça ou status social ou econômico.